Tempo de leitura: 7 minutos
No Brasil, os negócios familiares correspondem a mais de 85% das empresas atuantes no mercado e empregam quase 75% da força de trabalho no país. Ainda assim, estes modelos de negócios hereditários enfrentam enormes desafios para a sucessão familiar.
E um dos principais desafios para a sucessão familiar é a desavença entre os membros da família, que participam ou não da gestão do negócio.
Nesse sentido, a principal causa dos problemas no processo de sucessão familiar é a falta de um planejamento estratégico que inclua o processo sucessório como estratégia de perenização do negócio.
O que é sucessão familiar?
A sucessão familiar nos negócios é o processo de transferência da sua propriedade para a próxima geração da família dona do negócio.
Nesse sentido, ocorre quando é realizada a transferência da gestão (planejada ou não) do negócio para outros membros familiares:
- Filhos;
- Cônjuges;
- Irmãos;
- Netos;
- Sobrinhos, dentre outros.
Como fazer a sucessão familiar?
Antes de mais nada, o processo sucessório familiar deveria ser previsto com antecedência e incluído no planejamento estratégico do negócio, disponibilizado e comunicado a todos os stakeholders.
Nesse sentido, devem ser estabelecidas regras e métodos para definir e capacitar os herdeiros para a liderança.
Além disso, a sucessão familiar da empresa precisa estar adequada às características e aos momentos do negócio, sobretudo, de seus sócios e gestores.
Nos negócios, a herança familiar deve ser pautada por competências e não por sobrenomes, considerando a elegibilidade dos herdeiros por critérios profissionais e não de parentesco.
É preciso separar assuntos pessoais e profissionais, garantindo que temas de família não sejam discutidos em reuniões de gestão da empresa.
Da mesma forma, assegurar que aspectos profissionais não sejam levados para a mesa durante o almoço de domingo.
E uma das estratégias para evitar que isso aconteça é a mescla dos líderes do negócio entre familiares e pessoas de fora, limitando assim, o espaço para que estas discussões pessoais aconteçam no ambiente corporativo e interfiram no processo decisório.
Da mesma forma, em uma sociedade entre membros da mesma família, a elaboração de um acordo entre acionistas (sócios) é fundamental para definir as regras do jogo entre as partes, ou seja, os papéis esperados de cada um na gestão do negócio, seus direitos e deveres.
Nele estão descritos os pré-requisitos para iniciar um processo de sucessão familiar, mas normalmente não incluem todas as situações que podem permear o processo decisório, como por exemplo:
- Idade limite;
- Falecimentos;
- Tempo de casa;
- Grau de parentesco, dentre outras.
O mais comum é que essas regras sobre a herança familiar estejam em um documento separado, também assinado pelos sócios.
Como escolher e preparar o novo gestor do negócio após a sucessão familiar?
Uma das principais Soft skills que o gestor líder precisa possuir para dar continuidade ao negócio após a sucessão é a habilidade para lidar com pessoas.
E como na máxima: “aquele que arrasta exércitos cresce junto e faz o negócio crescer”!
Neste contexto, é importante identificar duas situações que necessitam abordagens diferentes: os papéis do sócio e do gestor.
É muito comum a família pensar que o sócio precisa se preparar para ser gestor, quando na verdade, ele precisa aprender a visão empresarial e estar pronto para continuar desenvolvendo o aspiracional que um dia levou à criação e ao desenvolvimento do negócio.
E para a escolha do gestor da empresa as necessidades do negócio sempre devem sobrepor o sobrenome e considerar o perfil profissional adequado para atender as demandas de cada estágio de maturidade da organização.
E aí está outro grande desafio para a sucessão familiar, que é a contratação de profissionais de fora da família para assumir cargos de liderança, como um CEO, por exemplo.
De acordo com pesquisas no mercado, dos CEOs externos contratados para gerir negócios familiares no Brasil, cerca de 70% não atingem 5 anos à frente da empresa e precisam ser substituídos. Ou seja, somente 30% têm sucesso.
Isto acontece porque, muitas vezes, as próprias empresas ainda não estão suficientemente preparadas para receber CEOs tipo “capa de revista”, com perfil e estilo diferenciados, mais arrojados e nem sempre em consonância com a cultura familiar e organizacional.
E aí, nesse caso vale o ditado: “prata da casa brilha melhor”.
O mais adequado seria identificar talentos dentro da própria família ou empresa, já conhecedores e praticantes da cultura familiar-organizacional.
Assim, poderiam ser desenvolvidos para assumir a liderança dos negócios e garantir a continuidade da essência familiar que levou a sua criação lá atrás.
Herança familiar e governança
Outra questão relacionada à gestão para o desenvolvimento das empresas diz respeito à implementação da governança corporativa nos negócios.
Nos negócios em família, onde a gestão é tipicamente mais centralizada, a governança corporativa pode otimizar a condução das operações e facilitar o processo de sucessão familiar.
Isto porque a governança segue uma política onde se sabe quem substitui quem numa eventual necessidade e o que deve ser feito nestas situações.
Ou seja, na falta de alguém, todos sabem quem vai substituir esta pessoa e o substituto, por sua vez, conta com autonomia e um playbook (manual) com as atividades que devem ser realizadas.
Garantindo assim que os processos ocorram de forma natural e equilibrada, com o consentimento de todos.
Da mesma forma, a governança define as regras para a interferência dos sócios na gestão e na operação cotidiana do negócio, respeitando a autoridade dos gestores, independentemente do sobrenome.
Em resumo, quanto maior a dependência de uma organização em uma pessoa somente, menor é o nível de governança implementado e mais desafiador será o processo sucessório eletivo ou emergencial.
E a implantação de um plano de governança, de acordo com as características da empresa, é fundamental para definir claramente quem é quem, entre sócios e gestores, e suas respectivas autoridades, responsabilidades e tarefas.
Além dos requisitos de elegibilidade para a herança familiar do negócio, como por exemplo: experiência profissional, qualificação acadêmica, tempo de casa, entregas realizadas, expertise desenvolvida, dentre outros.
Sucessão familiar e remuneração
Por fim, outro ponto crucial no planejamento sucessório é a definição da remuneração dos sócios, seja por dividendos, seja por bonificação ou pró-labore.
E a principal questão é o entendimento por parte dos donos que a empresa não pode ser uma vaca leiteira para sempre.
As habituais retiradas sem controle podem aumentar ainda mais as dificuldades para a continuidade dos negócios.
Da mesma forma, o pró-labore pago aos sócios não pode ser condizente ao sobrenome e sim, às práticas e valores do mercado.
Em conclusão, principalmente nas empresas familiares, é preciso que a cultura do “negócio em primeiro lugar” seja desenvolvida e seguida por todos.
Assim, a sucessão familiar garante a continuidade das operações e a viabilidade de mais investimentos para o crescimento e a perenidade da essência original do negócio.